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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A revista Época Negócios publicou na edição de Janeiro uma matéria realizada no Sertão da Paraíba, município de Paulista. A pequena cidade conquistou 22 medalhas nas Olimpíadas de Matemática das Escolas Públicas em 2012, sendo cinco medalhas de ouro. Para ter uma idéia, em toda Paraíba foram sete medalhas de ouro, uma em João Pessoa, uma em Patos e cinco em Paulista. A reportagem de Carlos Rydlewski revela o fenômeno que trouxe tantos frutos para a educação fundamental da cidade: a professora Jonilda.

Como Produzir Talentos

Na semana que antecedeu o Natal, eu e o fotógrafo Manoel Marques Neto enveredamos rumo ao alto sertão da Paraíba. Tínhamos como destino a pequena Paulista, uma cidade com 11.783 habitantes, a 397 quilômetros de João Pessoa, a capital do estado. Nossa missão era entender um fenômeno. Os estudantes do município paraibano, encravado no coração do semiárido nordestino, haviam se destacado em uma olimpíada de matemática, que mobilizou no ano passado 19,1 milhões de alunos da rede pública em todo o país. Os paulistenses conquistaram 22 prêmios. Foram cinco medalhas de ouro (um recorde para uma cidade desse porte), duas de prata, três de bronze e 12 menções honrosas. Tal resultado foi surpreendente. Superou, em termos proporcionais, o desempenho obtido pelos jovens entre 9 e 17 anos das principais cidades do Brasil.

À medida que seguíamos em direção ao interior, o cenário destoava cada vez mais de um ambiente que supúnhamos propício a um bom desempenho escolar. Principalmente em se tratando de uma disciplina como a matemática – o bicho-papão da estudantada.

Em longos trechos do percurso até Paulista, o que se via era o efeito da maior seca registrada na região nas últimas quatro décadas. A paisagem parecia ter sido destruída por um imenso incêndio. E foi. E ainda é. O Sol queima a região com temperaturas que vão além dos 40 graus nessa época do ano. Não chove, ali, desde outubro de 2011. Então, qual a explicação para tantas medalhas? Todas as respostas convergiam para um nome: Jonilda – ou melhor, professora Jonilda. Qual o seu segredo?

Maria
 Salete Laurentino gritou, riu e chorou. Fez tudo isso junto e misturado, repetidas vezes. Enquanto se dedicava a tais manifestações, ligou para todos os números que constavam da sua lista de contatos, no celular. Se eram muitos? “Só de irmãos tenho 13”, diz. Tamanha animação era justificável. Salete acabara de saber que a filha Miriam, de 12 anos, havia sido premiada com uma medalha de ouro na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, a Obmep, cujos resultados foram divulgados em dezembro.

A vitória de Miriam não se resumia ao prêmio. Ela, na verdade havia superado um trauma. Poucos meses antes da disputa, a garota nutria pavor por matemática. De repente, transformou-se.  Começou a se dedicar a matéria em três períodos ao dia. Pela manhã freqüentava a escola, à tarde estudava em casa e, à noite, fazia, aulas de reforço. Dormia sobre os livros. Preocupada, a mãe até lhe recomendava repouso. Qual o motivo da mudança? Miriam diz, em tom de brincadeira: “Foi a Jonilda que passou a mão na minha cabeça.”

Jonilda Alves Ferreira, de 44 anos, não tem poderes sobrenaturais, mas faz lá as suas mágicas. Natural de Paulista, leciona matemática desde 2002. Atualmente, dá aulas para seis turmas do 6º ao 9º ano, na Escola Municipal Cândido de Assis Queiroga. Na cidade, é identificada como a hospedeira de um vírus insólito – que disseminou uma febre por números. Os estudantes do município paraibano transformaram a matemática em brincadeira. “O melhor é que ela pode ser levada para qualquer lugar e nunca quebra”, diz Wanderson Ferreira, de 11 anos. O garoto já conquistou três medalhas na Obmep: dois ouros, em 2010 e 2011, e uma prata no ano passado. Adivinha de quem ele é filho? Da Jonilda.

Não é simples decifrar o dom de Jonilda, Ela fala em um ritmo pausado, quase sem variações no tom, como quem manifesta um certo fastio. A verborragia, definitivamente, não a brindou. Seu comportamento está a anos-luz dos professores espetáculo dos cursinhos pré-vestibular. Jonilda é calma – ao extremo. Tanta serenidade, no entanto, é interpretada de forma peculiar pelas crianças. “Ela transmite uma afetividade muito grande e isso é importante na educação”, diz Salete, a mãe de Miriam, também educadora (leciona história). “As crianças não têm medo ou vergonhas de conversar e tirar dúvidas com ela.”

O Método
Sim, existe empatia, mas também há método. Embora não conheça o trabalho dos grandes gurus globais da educação, Jonilda conta com um repertório variado de estratégias para dominar a sala de aula. Grande parte dos preceitos de teóricos como o americano Doug Lemov, autor de Aula Nota 10, ela adota intuitivamente. “Eu nunca bato de frente com meus alunos”, afirma. “Sempre tento demonstrar que a turma pode contar com meu apoio.” Esse lado “gente boa” tem contrapartida. A professora não permite indisciplinas. “Mas isso é fácil evitar: basta manter as crianças, principalmente as mais ativas, sempre ocupadas”, diz. “Se o aluno não tiver tempo, ele não causa problemas.”

Jonilda adora inovar. “Não sou alucinada, mas tenho as minhas idéias.” E não são poucas. Ela tem como princípio que, para aprender matemática, é imprescindível vivenciá-la. Assim, as aulas sobre fração são ministradas em uma pizzaria. À medida que os pedaçinhos são cortados, ela mostra o significado de um oitavo, um quinto... A farmácia serve de âncora para lições sobre medidas, com base na dosagem dos medicamentos. Números decimais? Em um posto de gasolina. E os estudos de estatística nada têm de fictício.  Os alunos coletam dados reais sobre a mortalidade infantil ou a incidência de doenças na população de Paulista. “Ela sempre foi assim”, diz Jocemar Alves Ferreira, também professora (leciona história) e irmã de Jonilda. “Sempre gostou de inventar.”

Jonilda também faz questão de envolver os pais nas lições de casa e não mede esforços para elogiar o bom desempenho dos alunos. Só não aceita respostas prontas, plagiada dos livros, sem escala no raciocínio dos estudantes. “Os alunos gostam e precisam ser desafiados”, diz. “Se a gente consegue estimulá-los, eles vão além do óbvio.” É o termo desafio, aliás, que explica em grande parte o sucesso das olimpíadas entre a garotada de Paulista. Nesse jogo, eles não só aprendem como se envolvem em uma saudável disputa.

Ano --- Ouro – Prata – Bronze – Menção honrosa – Total
2005 --    /     --    /     --       /     --        7                 --  7
2006 --    /     --    /     --       /     --        5                 --  5
2007 --    /     --    /     --       /     --        1                 --  1
2008 --    /     --    /     --       /     --        5                 --  5
2009 --    /     --    /      --      1     --        1                 --  2
2010 --    1    --    /      --      2     --        6                 --  9
2011 --    1    --    1     --      3     --        12               --  17
2012 --    5    --    2     --      3     --        12               --  22
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